por Donald Boudreaux, no Ordem Livre
Hoje, enquanto eu dirigia até meu escritório, passei por vários pedestres. E não matei nenhum deles!
Eu poderia tê-los matado com facilidade. Um leve movimento da minha mão ao volante, em qualquer momento, teria significado a morte certa para alguns pedestres. Mas não! Eu os deixei viver. E eu me orgulho disso!
Suponha que você fosse um desses pedestres e que eu exigisse de você manifestações de gratidão por não tê-lo atropelado. Como você reagiria? Você, certamente, e com razão, pensaria que eu estaria buscando descaradamente sua gratidão só por não ter passado por cima de você com o meu carro.
Ainda assim, os políticos buscam – e recebem – rotineiramente elogios por ações que não se diferem de modo significativo das ações dos motoristas que evitam atropelar pedestres inocentes.
Nós somos bombardeados com reportagens e comerciais exaltando como esse presidente ou aquele governador “criou” milhões de novos empregos ou como é responsável por qualquer crescimento econômico que tenha ocorrido durante seu mandato. Tais afirmações estão no mesmo nível intelectual e moral da minha afirmação de que mereço crédito por não ter matado pedestres com o meu carro.
Nenhum político cria prosperidade. Ela é criada por inúmeros empreendedores, companhias e trabalhadores competindo e cooperando nos mercados. É realmente desejável que o governo evite obstruir esses mercados – mas ele não cria a prosperidade que resulta deles. Insistir no contrário não seria nada diferente da minha insistência em dizer que eu, por ser o motorista que não atropelou a Sra. Jones enquanto ela voltava do supermercado, sou responsável pelo belo jantar que ela preparou naquela noite para a sua família.
Em qualquer oportunidade que a mais rara das criaturas – o político honesto – consegue afrouxar o domínio que o governo tem sobre nós, ele merece aplausos. Entretanto, mesmo esse tipo de político não merece crédito pelo crescimento econômico e cultural que virá a acontecer. Esse crédito pertence de fato às várias pessoas que criam, inovam, assumem riscos, poupam e trabalham para produzir o que os consumidores desejam.
A idéia de que o governo merece crédito por todos os benefícios produzidos pela liberdade é um caso especial de endeusamento do governo. Ao ser endeusado, o governo é erroneamente visto como responsável por todas as coisas boas que acontecem à sociedade – com a culpa sobre todas as coisas ruins sendo atribuída a demônios que, claro, deverão ser proibidos pelo governo.
Um número expressivo – e angustiante - de autores sustenta que a aparente recusa à intervenção por parte do governo seria, na verdade, apenas uma forma diferente de intervenção. Eis um exemplo: o economista Warren Samuels escreve que a desregulamentação é simplesmente a regulamentação governamental realizada por meio do fortalecimento dos direitos à propriedade privada, ao invés da edição de decretos burocráticos. De acordo com Samuels, apenas os inocentes acreditam que quando o governo desregulamenta, reduz sua influência sobre a economia.
Ou então considere a insistência de Louis Hacker em dizer que “a idéia do laissez faire é uma ficção. Já que o Estado, através da ação negativa – ou seja, pela recusa de adotar certas políticas – pode afetar os acontecimentos econômicos de forma tão significativa quanto quando intervém.”
Bem, é verdade – da mesma forma que eu, ao não guiar meu carro pela calçada cheia de pedestres, posso afetar os acontecimentos de forma tão significativa quanto como se eu fosse utilizá-lo para matar pedestres.
Samuels e Hackes estão certos apenas no sentido materialista mais básico: na medida em que o governo possui poder suficiente para restringir o comércio, podemos dizer que qualquer auto-restrição implementada pelo governo “afeta os acontecimentos econômicos”. Porém, uma falácia como essa erige secretamente, como sendo critério para a avaliação da atividade governamental, a máxima destruição possível que o governo poderia impor. Então, se quantidade real de destruição causada pelo governo ficar aquém daquela que o governo poderia ter causado, o governo recebe os créditos por ter produzido aquilo que apenas deixou de destruir. Obviamente, a utilização de um critério como esse é uma loucura.
Os militares soviéticos poderiam ter aniquilado a população dos Estados Unidos, com um ataque atômico, na hora que quisessem, durante a Guerra Fria. Será que deveríamos então creditar a prosperidade americana aos militares soviéticos?
Evitar a intervenção nos assuntos de outras pessoas é exatamenteoque deve ser feito por todos, inclusive pelo governo. Os nossos elogios são reservados para as pessoas que, heroicamente, ajudam outras pessoas, a quem não teriam obrigação nenhuma de ajudar. Já nossa condenação fica reservada às pessoas que se intrometem na vida das pessoas, sem serem convidadas.
Até que alguém me convença de que mereço uma grande festa toda vez que eu não atropelo pedestres com meu carro, continuarei a achar intolerável o aplauso e a gratidão ilegítima que os políticos recebem por não destruírem – ainda mais – as liberdades e riquezas que nos tomam atualmente.
Tarefa impossível...
Há 3 semanas
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