terça-feira, 23 de setembro de 2008

Não votar não é ser despolitizado

por Pedro Sette Câmara, no Ordem Livre

Nas escolas e nas universidades existe muita preocupação com o voto. Ninguém quer ser visto como “alienado” (é impressionante como os chavões dos anos 60 perduram entre os mais jovens; será que vamos ter de esperar a geração de seus professores simplesmente morrer para que isso acabe?). Para ser devidamente politizado, você tem de estar conectado ideologicamente com alguma das opções atuais, e simplesmente não se sentir representado por ninguém é a) um dilema terrível, ou b) uma frescura pura e simples. Você precisa ter em quem votar.

Eu mesmo acreditei nessa bobagem por anos a fio. Ficava lendo sobre política, discutindo, e ao mesmo tempo tentava justificar a apolitéia só porque não voto em ninguém, não me sinto representado por ninguém e não me lembro de um político cujo discurso não me tenha feito pensar: “Isso não faz o menor sentido, ele não completa nenhum raciocínio; Deus, me ajude!” Enquanto eu falava sobre princípios e valores, lentamente fui vendo como essas coisas se aplicavam à minha vida prática. Não sou político, nunca vou nem tentar ser; mas sou, querendo ou não, um zoon politikon, um animal social. Não vivo na pólis perfeita, nem vejo com bons olhos o desejo de implementar uma sociedade perfeita neste mundo; mas como vou me relacionar com a sociedade que existe à minha volta? Como meus princípios liberais me orientam?

Nessa questão do voto, a primeira coisa que sei é bem simples. Eu sou politizado. Não admitirei que o conjunto limitado e pouco inspirador das opções de políticos determine o que eu vou fazer, nem a minha identidade. Eu sou algo que não é representado por nenhum partido, e isso é problema dos partidos, não meu. Aquilo que escrevo, que discuto e que leio faz de mim alguém politizado em termos diferentes e mais justos do que aqueles usados no senso comum, e isso não é difícil de explicar.

As pessoas que se julgam politizadas estão sempre discutindo o mesmo tema, com base na mesma premissa: “o que devemos fazer com a máquina onipotente do Estado, que deve permanecer onipotente?” Não apenas a premissa é totalitária, como a premissa por trás da idéia de que ser politizado é restringir-se a essa discussão é igualmente totalitária. Se você acredita que lutar contra o totalitarismo é uma boa coisa, a primeira coisa a fazer é rejeitar todos os candidatos que dependam da lógica desse estado intervencionista. Ser politizado também é levantar a pergunta “e como o governo pode sair de cima dos cidadãos e parar de atrapalhar suas vidas?” Ou ainda: “por que o governo deveria ter todo esse poder?” “Do que exatamente estamos falando quando dizemos palavras como desigualdade?” “Será que um problema causado pela intervenção estatal deve ser resolvido com mais intervenção?”

É muito mais proveitoso – para si mesmo e para a sociedade – que você estude a Política de Aristóteles, o Segundo tratado de governo de Locke ou obras semelhantes. Se você as estuda, se discute, se consegue criticar as políticas públicas atuais com base em seus estudos, está abrindo a possibilidade de que algum dia algum político venha a representá-lo, porque, como explicou Hayek em seu famoso ensaio sobre os intelectuais, os políticos não são líderes, mas seguidores. Eles precisam atender a um anseio que exista na população, e por isso é melhor lançar novas idéias do que resignar-se com as antigas.

Enquanto isso, não se sinta culpado por não ter em quem votar. Pague a pequena multa de R$3,51 pelo não-comparecimento ou simplesmente anule seu voto. Se você só gosta de massas, não se sente obrigado a entrar num restaurante que só servisse carnes. Se você tem um gosto refinado, não se sente obrigado a consumir algo inferior. Não pense que existe alguma obrigação moral de escolher entre candidatos que simplesmente não o representam, e economize o tempo e a energia que gastaria com isso pensando em como reformular as questões da maneira mais adequada.

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