terça-feira, 10 de junho de 2008

Compreendendo a liberdade de escolha

por Diogo Costa, no Ordem Livre

O valor político supremo da filosofia liberal não é o crescimento econômico. Não é o aumento da expectativa de vida. Não é o progresso tecnológico. Não é a erradicação da pobreza. O grande valor político liberal é a liberdade de viver conforme nossas próprias convicções sem a interferência coercitiva do Estado. Um liberal pode acreditar, como eu acredito, que uma sociedade liberal seja economicamente mais próspera, tecnologicamente mais avançada, e tenha menores índices de mortalidade e pobreza. Mas o liberal não defende a liberdade como simples instrumento para resultados econômicos. Ele percebe um valor intrínseco na ação humana.

A defesa do livre mercado é, portanto, uma defesa da nossa liberdade de escolher como proceder com os bens econômicos. Defendemos o livre mercado justamente porque ele é livre. Essa apreciação moral paira acima do entendimento de como esse sistema econômico sacia nossas vontades. Como disse Wilhelm Röpke:

Nós defenderíamos essa ordem econômica mesmo se ela impusesse sobre as nações algum sacrifício material enquanto o socialismo mantivesse a promessa da melhoria do padrão de vida. Sorte nossa que exatamente o oposto é verdadeiro - o que a experiência claramente já mostrou ser óbvio, mesmo para os mais teimosos.

Mas a afirmação do valor intrínseco da liberdade de escolher (e de não usar de força contra as escolhas alheias) é percebido por muitos como a negação da idéia de virtude e vício. Certos críticos do liberalismo desprezam a valorização autônoma da liberdade como se ela implicasse uma relativização dos valores. Há escolhas melhores do que outras, e nem todas as escolhas (mesmo as que não violam a liberdade de escolha alheia) podem ser equiparadas, como pretendem os liberais. Sem uma hierarquia bem definida de valores não pode haver ordem social.

Essa visão, entretanto, não se sustenta ao menor escrutínio. É um erro considerar que os liberais necessariamente aderem a um relativismo que nivela todas as decisões humanas como moralmente equivalentes. A liberdade enquanto finalidade política não implica na substituição de hierarquia de valores por um achatamento moral. Pelo contrário. Se todas as escolhas fossem iguais, não seria necessária a liberdade. Toda a sociedade poderia simplesmente obedecer a um plano moral único. A qualquer plano moral, na verdade. Todas as decisões já poderiam vir prontas das autoridades, pois não seria moralmente diferente se sua vida fosse decidida pelo hábito das deliberações voluntárias ou por uma seqüência de cara-ou-coroa.

É exatamente porque os liberais entendem que cada decisão é importante, que há escolhas boas e escolhas ruins, que eles compreendem a virtude da liberdade de decidir. Uma sociedade liberal não é uma afirmação de relativismo, mas uma harmonização do pluralismo. Nela, pessoas com diferentes ambições, fraquezas, sonhos, paixões, podem buscar seus objetivos em paz. Além disso, as decisões individuais não geram efeitos perversos na mesma escala que as decisões políticas do estado-nação. É melhor que os efeitos negativos das decisões erradas afetem os responsáveis por elas, e não que sejam impostos a milhões de pessoas.

Uma sociedade liberal não ignora o mau uso de nossa liberdade, apenas garante a todos o direito de fazermos escolhas louváveis ou condenáveis, e de sermos responsáveis pelas suas conseqüências.

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