quarta-feira, 25 de junho de 2008

Segundo Tratado Sobre o Governo Civil, de John Locke (Excertos)

no Ação Humana

Assim como a usurpação consiste em exercer um poder a que um outro tem direito, a tirania consiste em exercer o poder além do direito legítimo, o que a ninguém poderia ser permitido. É isto que ocorre cada vez que alguém faz uso do poder que detém, não para o bem daqueles sobre os quais ele o exerce, mas para sua vantagem pessoal e particular; quando o governante, mesmo autorizado, governa segundo sua vontade, e não segundo as leis, e suas ordens e ações não são dirigidas à preservação das propriedades de seu povo, mas à satisfação de sua própria ambição, vingança, cobiça ou qualquer outra paixão irregular.

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É um erro acreditar que este defeito é exclusivo apenas das monarquias; outras formas de governo também podem estar propensas a possuí-lo. Cada vez que um poder, colocado nas mãos de alguém que deve governar o povo e preservar suas propriedades, é aplicado para outros objetivos e é utilizado para empobrecer, perseguir ou subjugar o povo às ordens irregulares e arbitrárias daqueles que o detêm, imediatamente se transforma em uma tirania, seja este abuso cometido por um ou mais homens. Por exemplo, podemos ler a história dos trinta tiranos de Atenas ou aquela de um tirano único em Siracusa; e a intolerável dominação dos decênviros em Roma não foi nada melhor.

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Pode-se resistir às ordens de um príncipe? A resistência é legítima todas as vezes que um indivíduo se percebe lesado ou imagina que não lhe foi feito justiça? Isto vai perturbar e transtornar todos os regimes políticos e, em vez de governo e ordem, não se terá senão anarquia e confusão. A isso eu respondo: Não se deve opor a força senão à força injusta e ilegal; quem quer que resista em qualquer outra circunstância atrai para si uma condenação justa, tanto de Deus quanto dos homens; e em conseqüência só virão perigos e tumultos, como freqüentemente é sugerido.

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Por isso, aquele que tenta colocar outro homem sob seu poder absoluto entra em um estado de guerra com ele; esta atitude pode ser compreendida como a declaração de uma intenção contra sua vida. Assim sendo, tenho razão em concluir que aquele que me colocasse sob seu poder sem meu consentimento me usaria como lhe aprouvesse quando me visse naquela situação e prosseguiria até me destruir; pois ninguém pode desejar ter-me em seu poder absoluto, a não ser para me obrigar à força a algo que vem contra meu direito de liberdade, ou seja, fazer de mim um escravo.

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